domingo, 21 de agosto de 2016

esqueci de contar que mudei.

Descrever é a maneira mais cansativa de detalhar o repertório de manias, gestos e gostos que parecem mais não estar. Não farei desta vez o mesmo de antes. As coisas duras e de textura fria vibram para se apresentar assim somente: frias e duras. É como quando faço uma paragem e sinto o sangue correr entre os dedos das pernas, não mais descreverei a pausa em movimento. Penso aqui, imagino uma onda se esvaindo pela janela, encontrando outras ondas, talvez de som, talvez calor, transformando tudo numa lógica bolha hiperquântica, e eu sei que este buraco sem prego na parede não precisa ser reocupado. Ainda posso ver um filete de vento bater ali e cuspir pó pelos pelos todos do seu braço. A matéria deteriora, a matéria deteriora em ponto, a matéria deteriora e meia, a matéria deteriora em pleno meio dia.
                                                                                                                                


                                                                    Onde está você, rapaz?


Bóio no vazio sem cueca e só as coisas mesmo para criar imanência. Escrevo um bilhete para lembrar que tocar a forma e identificar uma cor é estar fincado, não perco mais um pensamento se você não estiver aqui de volta. É questão de mérito. Cuidado com as suas conquistas, eu sei destilar segurança só em me vestir. Conta de novo aquele segredo pequeno. Calor na minha pele é afago sozinho, meu corpo liquefaz água pelos buracos, é como chorar de corpo inteiro, eu não mais descreverei.

                                                                                                                               




                                                                                   Posso deitar aí, rapaz?





Cacei algumas palavras que dessem continuidade a estória que estava naquele papel amassado. Eu guardei no bolso antes da viagem, mas por uma maravilha clichê, ele foi aos ares com o vento e metáfora. Sem fim, sem sentido. Virar a página requer um encaixe adestrado na ponta dos dedos e no pequeno triângulo logo na extrema direita da folha. Trata-se de um encontro. Foi por uma distração mesmo, não consigo ver o corte, mas posso sentir a dor aguda e fina. Uma dor fina e aguda. Lateja e lembra todas as horas que eu cortei o dedo na folha que eu não colei o poema do nosso,minto, do meu livro. Não posso ver a pele fina rasgada, não como mais as palavras, chupo o dedo e lambo o corte como beijo que sara.

É um estandarte só meu e dentro da cabeça, não sai não adianta. Junto ao seu rosto meus cabelos, eles nascem dentro de onde não se vê, extravasam o limite da cabeça até para onde quer que eu vá. Rosto seu embolado nos cabelos meus. Ficam agarrados feito teia, não adianta que não sai. Balanço bandeira que nem cabelo, meus fios se erguem pela descarga elétrica, parece que choveu muito aí, então eu sei que você sente frio enquanto imagem, eu amarro o cabelo forte até que você se sufoque. Meu pensamento não é morada para sua distância, embaralho os fios da cabeça, quem sabe você volta, desisto, raspei.





                                              Você me empresta um pouco, rapaz?

enquanto ele não chega.

rabisco paredes
contagem mental
chega desconhecido
leio gestos
explosões internas
abro maçanetas
café passado
dupla esperada
papel vago
bolso sujo
onde esteve?

alegria astral
durma sempre
aqui agora
revisito manias
perto perplexo
faço feira
dia nublado
menino laranja
recomposto conforto
dinheiro fora
peito porto.